ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
COORDENAÇÃO-GERAL DE ORIENTAÇÃO
Parecer Nº 89/2014/DECOR/CGU/AGU
PROCESSO: 00593.001066/2014-06
INTERESSADO: Consultoria Jurídica da União no Estado de Goiás – CJU/GO.
ASSUNTO: Desenquadramento do Simples Nacional e Manutenção do Equilíbrio Econômico-Financeiro em Contratos Administrativos.
DIREITO ADMINISTRATIVO – CONTRATO ADMINISTRATIVO – EXCLUSÃO DO SIMPLES NACIONAL – REPERCUSSÃO NO CUSTO TRIBUTÁRIO – REEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO – IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.
1. Embora a exclusão do referido tratamento tributário diferenciado eventualmente ocasione aumento da carga tributária, não se trata de criação de novo tributo ou encargo legal e sim saída de regime de tributação mais benéfico.
2. A exclusão do SIMPLES NACIONAL por ato voluntário ou decorrente da ultrapassagem dos limites de enquadramento previstos na Lei Complementar nº 123/2006 não se amolda ao conceito de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis que retardem ou impeçam a execução do ajustado. Trata-se de um aumento de custo inserto na álea econômica ordinária.
3. O reajuste e a repactuação são institutos destinados a recompor os preços em função do aumento dos custos de contratação, oriundos das variações das condições mercadológicas, mormente a prevenção da degradação monetária trazida pelos índices inflacionários. Na situação ora examinada o aumento do custo contrato não ocorreu por questões próprias de mercado e sim diante de condição peculiar do contratado.
Senhor Coordenador-Geral,
Trata-se de expediente encaminhado pela Consultoria Jurídica da União no Estado de Goiás – CJU/GO informando acerca de divergência de entendimentos jurídicos entre diversos órgãos consultivos da Advocacia-Geral da União, motivo ensejador da pacificação quanto ao entendimento a ser adotado no âmbito da Administração Pública Federal. As informações vieram encaminhadas por meio do Memorando nº 00018/2014/GAB/CJU-GO/AGU, nos seguintes termos:
“Considerando o teor do Parecer nº 920/2012/CJU-SP/CJU/AGU (anexo), que entende não haver direito ao reequilíbrio econômico-financeiro nos casos de exclusão do SIMPLES, por opção da empresa, com o qual concorda o Parecer nº 263/2014/CJU-GO/CGU/AGU (anexo); e, de outro lado, o Parecer nº 293/2014/CJU/MT/CJU/AGU e o parecer nº 03/2012/GT359/DEPCONSU/PGF/AGU (anexos), que reconhecem o direito ao reequilíbrio econômico-financeiro nos casos de exclusão do SIMPLES, seja na exclusão obrigatório ou na exclusão por opção, submete-se o assunto ao DECOR, para que uniformize a questão, definindo se a exclusão do SIMPLES, seja por opção da empresa, seja no caso de exclusão obrigatória, confere o direito ao reequilíbrio econômico-financeiro.”
2. A questão gira em torno da obrigatoriedade de se restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro quando determinada sociedade empresária contrata com a Administração Pública na qualidade de optante do Simples Nacional e posteriormente não mais ostenta essa condição, seja em razão de mera opção pela retirada do referido sistema simplificado de arrecadação de tributos, seja por conta da ultrapassagem do limite de receita bruta estipulado na Lei Complementar nº 123/2006, relativas ao enquadramento como Empresa de Pequeno Porte.
3. A Consultoria Jurídica da União no Estado de Mato Grosso – CJU/MT se manifestou pela necessidade de recomposição da equação econômico-financeira asseverando a previsão deste direito na Constituição Federal, além de também constar no Art. 65, II, “d” e § 5º do mesmo artigo da Lei nº 8.666/1993, objetivando a manutenção das condições iniciais no que tange especialmente à justa retribuição financeira pela execução do contrato.
4. Todavia, chama-nos atenção para o fato da mudança de regime de tributação nem sempre acarretar maior ônus tributário à empresa, mormente se o regime que mesma passou adotar beneficiado com compensações ou créditos serem abatidos dos valores serem recolhidos. Diante disso, é incumbência da empresa interessada demonstrar que sua exclusão do SIMPLES e, consequentemente, sua mudança de regime de tributação efetivamente repercutiu nos custos contemplados na proposta vencedora.
5. As conclusões da CJU/MT foram assim sintetizadas:
“11- Conforme bem salientado no artigo doutrinário acima transcrito, aumento da receita bruta da contratada, causador de sua exclusão do SIMPLES, caracteriza-se como evento imprevisível, apesar de desejável e almejado, o que não desnatura seu caráter potencial de desequilibrar a equação econômico-financeira garantida constitucionalmente. Ou seja, não restringe Direito da contratada previsão do 1º do art. 23 da IN 02/2008 de que a contratada deve arcar com ônus decorrente de eventual equívoco no dimensionamento dos quantitativos de sua proposta, inclusive quanto aos custos variáveis decorrentes de fatores futuros incertos, tais como os valores providos com quantitativo de vale transporte, devendo complementá-los, caso previsto inicialmente em sua proposta não seja satisfatório para atendimento do objeto da licitação, exceto quando ocorrer algum dos eventos arrolados nos incisos do 1º do art. 57 da Lei nº 8.666, de 1993. (...)”
6. Vejamos excerto da manifestação do Departamento Consultivo da Procuradoria-Geral Federal, que bem elucida seu posicionamento:
“6.18. A alteração contratual decorrente da inclusão/exclusão do SIMPLES parece mais se amoldar à regra específica do §5° do mesmo art. 65 da Lei de Licitações. Observando a literalidade deste último dispositivo, constata-se que podem dar ensejo revisão dos preços contratados (para mais ou para menos) criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, bem como superveniência de disposições legais (qualquer disposição, tributária ou não), desde que esses fatos (1º); ocorram após data de apresentação da proposta e (2º) tenham comprovada repercussão nos preços contratados.
6.19. Ora, as alterações de tributos encargos legais decorrentes da inclusão ou exclusão do SIMPLES, seja essa inclusão/exclusão com base em quaisquer motivos (opcional, obrigatório ou de oficio), além de terem respaldo na LC 123/2006, não implicam criação ou extinção, mas alteração nos tributos e encargos legais da contratada. Assim, caso essa alteração (1º) ocorra após a apresentação da data de apresentação da proposta (2º) tenha comprovada repercussão nos preços contratados, pode dar ensejo revisão nos preços, para mais ou para menos.” (sic)
7. Advogando o entendimento contrário ao acima mencionado, ou seja: não vislumbrando o direito ao reequilíbrio econômico-financeiro, na situação em voga, temos as Consultorias Jurídicas da União nos Estado de São Paulo e Goiás. Observe-se a conclusão da CJU/SP:
“34. Nestes termos, em conclusão de todo o exposto, adotamos seguinte entendimento sobre a matéria:
a) empresa de vigilância, enquadrável na exceção expressa dos arts. 17, § 1º e 18, §§ 5°-C 5°-H, da Lei Complementar n° 123/2006, não está vedada de optar pelo Simples Nacional, ainda que preste serviços mediante cessão ou locação de mão-de-obra, de forma que também não incide hipótese de exclusão obrigatória prevista no art. 30, II, da mesma lei mostrando-se possível, pois, exclusão por opção (art. 30, I) (parágrafos 05 a 11);
b) aumento de custos decorrente da exclusão por opção do Simples Nacional e da consequente alteração do regime tributário não causa para revisão dos preços contratuais, por não enquadrar-se na disciplina específica do art. 65, § 5º, da Lei n° 8.666/93 (parágrafos 13 15), nem como hipótese de reajustamento em sentido amplo reajuste ou repactuação (parágrafos 17 25) ou reequilíbrio econômico-financeiro (parágrafos 26 33).”
8. Por fim, trazemos a lume trecho do opinativo proferido pela CJU/GO, o qual resume os argumentos pertinentes ao desenquadramento do SIMPLES, a respectiva repercussão tributária e as consequências na seara dos contratos administrativos firmados:
“33. A repactuação derivada de suposto aumento de tributos federais por exclusão do SIMPLES não pode ser concedido, primeiro, porque não comprovado tempo em que ocorreu exclusão (se antes ou depois da prorrogação anterior). E mesmo que tenha sido posteriormente prorrogação anterior, não foi comprovado aumento derivado da suposta exclusão do regime tributário, nem esta exclusão, que tal aumento tenha sido imprevisível, de conseqüências incalculáveis, inviabilizando execução do contrato, única circunstância que ensejaria um reequilíbrio econômico-financeiro (artigo 65, II, "d" da Lei de Licitações). Aliás, imprevisibilidade não tem lugar em mudança de regime de tributação, se não adveio por alteração da legislação. Acresça-se que exclusão do SIMPLES não é caso de repactuação, nem de reajuste em sentido estrito, conforme aliás já assentou Parecer nº 920/2012/CJU-SP/CGU/AGU. E da mesma maneira, não se aplica § 5º do artigo 65 da Lei nº 8.666/93, porque não se trata de lei que tenha alterado ou criado tributo ou encargo legal, mas eventual exclusão de regime de tributação, que não decorre de tributo criado ou alterado, mas de fato pertinente própria contratada, pois suposto aumento na tributação teria se dado por exclusão de um regime tributário favorecido, passando se sujeitar ao regime comum, não por força de legislação superveniente. Portanto, caso planilha apresentada pela contratada, que foi analisada considerada correta pelo órgão consulente tenha contemplado aumento relativo mudança de tributação, segundo requerido no pedido de repactuação (fl. 1014), deverá ser exigida correção da planilha, excluindo esse alegado aumento referente mudança de tributação.”
9. É o breve relatório. Passa-se aos fundamentos
10. Indubitável o estabelecimento da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro no inciso XXI do art. 37 da Carta Constitucional. Todavia, essa determinação deve ser viabilizada mediante a observância dos ditames das leis pertinentes, em especial a Lei nº 8.666/93 e suas respectivas normas de regulamentação. Nesse contexto, importa aclarar as formas de preservação da equação econômico-financeira reconhecidas na doutrina e jurisprudência.
11. O Tribunal de Contas da União já se manifestou sobre o tema no Acórdão nº 1.563/2004 – TCU - Plenário, ocasião em que deixou assentadas as seguintes considerações:
“Assim, seria defensável a existência do gênero reajustamento de preços em sentido amplo, que se destina a recuperar os valores contratados da defasagem provocada pela inflação, do qual são espécies o reajustamento de preços em sentido estrito, que se vincula a um índice, e a repactuação de preços, que exige a análise detalhada da variação dos custos.”
12. Da decisão acima destacada denota-se a existência de dois grandes grupos de institutos relativos à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro: reajustamento em sentido amplo, englobando tanto o reajuste em sentido estrito quanto a repactuação e de outro lado a revisão lastreada na teoria da imprevisão propriamente dita. Verificamos, ainda, a existência de uma revisão fundada especificamente no aumento da carga tributária, esta última com fulcro no art. 65, § 5º da Lei nº 8.666/93.
13. Lucas Rocha Furtado deixa bem vincada a distinção entre o reajuste e a repactuação:
“A diferença entre o reajuste e a repactuação reside no critério empregado, pois, na primeira opção, vincula-se a recomposição a índice estabelecido contratualmente, ao passo que na segunda forma de recomposição, na repactuação, a recomposição do equilíbrio do contrato ocorre por meio da demonstração analítica da variação dos componentes dos custos que integram o contrato, tomando-se como parâmetro a proposta do contrato.”[1]
14. A teoria da imprevisão demonstra-se aplicável, nos dizeres do art. 65, II, “d” da lei nº 8.666/93, diante de “(...) fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.”
15. Por fim, temos a previsão específica quanto ao aumento do custo tributário, sob a qual nos deteremos inicialmente, constante do art. 65, § 5º da Lei de Licitações:
“Art. 65 (...)
§ 5º Quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados ou extintos, bem como a superveniência de disposições legais, quando ocorridas após a data da apresentação da proposta, de comprovada repercussão nos preços contratados, implicarão a revisão destes para mais ou para menos, conforme o caso.”
16. Ora, o aumento da carga tributária e o respectivo impacto na consecução do contrato administrativo firmado, decorrente da superveniência do desenquadramento da sociedade empresária do SIMPLES NACIONAL, não se coaduna com o regramento trazido no dispositivo legal acima mencionado. Embora a questão do enquadramento ou não no referido tratamento tributário diferenciado eventualmente ocasione aumento da carga tributária, não se trata de criação de novo tributo ou encargo legal e sim saída de regime de tributação mais benéfico.
17. Note-se que o permissivo legal intenta preservar a situação do particular que, logicamente, sequer possuía condições de considerar custos advindos em momento posterior e acompanhados da imperatividade da lei, em nosso sentir trata-se de projeção do princípio da não surpresa no âmbito administrativo, em efetiva homenagem à segurança jurídica. Impende ressaltar também que as hipóteses de exclusão voluntária do SIMPLES já vieram explicitadas desde a vigência da Lei Complementar nº 123/2006, nos termos do art. 30:
“Art. 30. A exclusão do Simples Nacional, mediante comunicação das microempresas ou das empresas de pequeno porte, dar-se-á:
I - por opção;
II - obrigatoriamente, quando elas incorrerem em qualquer das situações de vedação previstas nesta Lei Complementar; ou
III - obrigatoriamente, quando ultrapassado, no ano-calendário de início de atividade, o limite proporcional de receita bruta de que trata o § 2º do art. 3º;
IV - obrigatoriamente, quando ultrapassado, no ano-calendário, o limite de receita bruta previsto no inciso II do caput do art. 3º, quando não estiver no ano-calendário de início de atividade.”
18. Assim, é de se observar que a despeito da situação fática que deu origem ao desenquadramento ocorrer posteriormente, a norma jurídica delimitando as situações de exclusão já existe há muito tempo, não se configurando, pois, como superveniência de disposição legal. Nesse contexto, é possível aproximar a situação ora debatida da revogação de isenção, pois ambas implicam pagamento a menor de tributo sob certas condições, mutatis mutandis. Inclusive cabe destacar que no julgamento do RE 204.062 o Supremo Tribunal Federal reafirmou a tese de que a revogação de isenção não se equipara à criação ou majoração de tributo, tratando-se apenas de permissão legal para pagamento a menor até que o benefício fiscal seja suprimido, sendo admissíveis as mesmas razões quanto à exclusão do SIMPLES.
19. O regramento trazido pelo art. 30 supracitado denota claramente a previsibilidade quanto à possibilidade de ultrapassar o limite de enquadramento estabelecido no art. 3º da Lei Complementar nº 123/2006. Não sendo crível que hodiernamente a elevação da receita bruta da sociedade empresária não seja objeto de cuidadoso acompanhamento, mormente ao se considerar as conhecidas repercussões na seara do SIMPLES NACIONAL.
20. Avaliemos nesse momento a aplicação do art. 65, II, “d” da Lei nº 8.666/1993:
“Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:
(...)
II - por acordo das partes:
(...)
d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)”
22. A manutenção da receita bruta anual nos patamares exigidos pela lei é uma condição, afeta por tanto a evento futuro e incerto, nos termos do art. 121 do Código Civil. Todavia, a incerteza diz respeito somente a impossibilidade de determinação exata atinente ao tempo do acontecimento do evento ou mesmo de sua efetiva ocorrência, mas não existe necessária correlação com a imprevisibilidade. A mera possibilidade de aferição quanto a maior proximidade ou não da ocorrência do evento, por si só, já representa a previsibilidade. Demais disso, não se trata de caso de força maior, caso fortuito, fato do príncipe ou álea econômica extraordinária.
23. Ao contrário do que preconiza o Parecer nº 293/2014/CJU/MT/CJU/AGU a exclusão do SIMPLES resulta em uma desconformidade em relação ao custo para a realização dos serviços contratados e a proposta ideal, que deve ser absorvida pelo proponente diante do dimensionamento equivocado de sua parte, na esteira do disposto no art. 23, § 1º da INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 2, DE 30 DE ABRIL DE 2008:
“Art. 23. A contratada deverá arcar com o ônus decorrente de eventual equívoco no dimensionamento dos quantitativos de sua proposta, devendo complementá-los, caso o previsto inicialmente em sua proposta não seja satisfatório para o atendimento ao objeto da licitação exceto quando ocorrer algum dos eventos arrolados nos incisos do § 1º do art. 57 da Lei nº 8.666, de 1993.
§ 1º O disposto no caput deve ser observado ainda para custos variáveis decorrentes de fatores futuros e incertos, tais como o valor provido com o quantitativo de vale transporte. (Nova redação dada pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 4, DE 11/10/2009)”
24. Os argumentos até aqui trazidos direcionam-se para o tratamento da exclusão do SIMPLES, decorrente da ultrapassagem dos limites legais de enquadramento, como fato previsível e de consequências determinadas, insuscetível de ensejar o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. Destarte, despiciendas maiores considerações quanto a exclusão voluntária, que representa ainda maior grau de ciência no que toca as consequências da saída do regime tributário simplificado, uma vez que esta discricionariedade vincula-se a previsibilidade, trazendo consigo inclusive a alta probabilidade de exercício abusivo de direito, consubstanciado em expediente provisório destinado a estabelecer tão somente custo menor ao proponente, que logo em seguida solicita o restabelecimento do equilíbrio financeiro, em patente violação à justa competição no procedimento licitatório.
25. Assentada a premissa de que a saída do SIMPLES NACIONAL não configura revisão com base no art. 65 da Lei nº 8.666/1993 cumpre-nos analisar eventual classificação como reajuste ou repactuação. Para tal desiderato, julgamos acertada a manifestação proferida no Parecer nº 920/2012/CJU-SP/CJU/AGU, da qual nos franqueamos destacar os trechos abaixo:
18. As duas espécies de reajustamento - o reajuste em sentido estrito (art. 40, XI, da Lei n° 8.666/93 e arts. 1º a 3º da Lei nº 10.192/2001) e a repactuação (art. 5º do Decreto n° 2.271/97) - diferem pela forma como se dá tal readequação de preços: no reajuste, tem-se aplicação automática de um índice setorial ou geral predeterminado; na repactuação, tem-se a demonstração analítica, caso a caso, da variação dos custos incidentes na contratação.
(...)
20. O mesmo entendimento é compartilhado no emblemático Acórdão n° 1.827/2008 - Plenário do TCU e no PARECER N° AGU/JTB 01/2008, aprovado pelo
Presidente da República, nos termos do art. 40, § 1º, da Lei Complementar n° 73/93 (Lei Orgânica da AGU), e, portanto, vinculante a toda a administração pública federal, a seguir transcrito:
"A repactuação, como asseverado pelo Tribunal de Contas da União, em seu Acórdão nº 1.563/2004-TCU-Plenário, bem como pela doutrina administrativista, pode ser considerada como uma espécie de reajustamento de preços. Em sede do Acórdão nº 1.563/2004-TCU-Plenário, a Corte de Contas teceu os seguintes comentários:
Assim, seria defensável a existência do gênero reajustamento de preços em sentido amplo, que se destina a recuperar os valores contratados da defasagem provocada pela inflação, do qual são espécies o reajustamento de preços em sentido estrito, que se vincula a um índice, e a repactuação de preços, que exige análise detalhada da variação dos custos.
Acrescenta a mesma decisão, ainda, que "tanto o reajustamento de preços quanto a repactuação dos preços visam a recompor a corrosão do valor contratado pelos efeitos inflacionários".
26. Considerando o escólio doutrinário, bem assim o entendimento do Tribunal de Contas da União, pelos quais o reajuste e a repactuação são institutos destinados a recompor os preços em função do aumento dos custos de contratação, oriundos das variações das condições mercadológicas, mormente a prevenção da degradação monetária trazida pelos índices inflacionários, de se notar que a exclusão do SIMPLES não se amolda aos mesmos. Na situação ora examinada o aumento do custo contrato não ocorreu por questões próprias de mercado e sim diante de condição peculiar do contratado, qual seja, o aumento de carga tributária decorrente da exclusão voluntária ou compulsória do regime simplificado.
27. A partir do art. 37 da Instrução Normativa n° 2, de 30 de abril de 2008 da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - SLTI/MPOG são tratados mais detidamente alguns aspectos da repactuação, vejamos:
“Art. 37. A repactuação de preços, como espécie de reajuste contratual, deverá ser utilizada nas contratações de serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra, desde que seja observado o interregno mínimo de um ano das datas dos orçamentos aos quais a proposta se referir, conforme estabelece o art. 5º do Decreto nº 2.271, de 1997. (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
§ 1º A repactuação para fazer face à elevação dos custos da contratação, respeitada a anualidade disposta no caput, e que vier a ocorrer durante a vigência do contrato, é direito do contratado, e não poderá alterar o equilíbrio econômico e financeiro dos contratos, conforme estabelece o art. 37, inciso XXI da Constituição da República Federativa do Brasil, sendo assegurado ao prestador receber pagamento mantidas as condições efetivas da proposta. (Incluído pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
(...)
§ 3º Quando a contratação envolver mais de uma categoria profissional, com datas-base diferenciadas, a repactuação deverá ser dividida em tantas quanto forem os acordos, dissídios ou convenções coletivas das categorias envolvidas na contratação. (Incluído pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
§ 4º A repactuação para reajuste do contrato em razão de novo acordo, dissídio ou convenção coletiva deve repassar integralmente o aumento de custos da mão de obra decorrente desses instrumentos. (Incluído pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
Art. 38. O interregno mínimo de 1 (um) ano para a primeira repactuação será contado a partir:
I - da data limite para apresentação das propostas constante do instrumento convocatório, em relação aos custos com a execução do serviço decorrentes do mercado, tais como o custo dos materiais e equipamentos necessários à execução do serviço; ou (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
II - da data do acordo, convenção ou dissídio coletivo de trabalho ou equivalente, vigente à época da apresentação da proposta, quando a variação dos custos for decorrente da mão-de-obra e estiver vinculada às datas-base destes instrumentos. (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
(...)
Art. 40. As repactuações serão precedidas de solicitação da contratada, acompanhada de demonstração analítica da alteração dos custos, por meio de apresentação da planilha de custos e formação de preços ou do novo acordo convenção ou dissídio coletivo que fundamenta a repactuação, conforme for a variação de custos objeto da repactuação. (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
§ 1º É vedada a inclusão, por ocasião da repactuação, de benefícios não previstos na proposta inicial, exceto quando se tornarem obrigatórios por força de instrumento legal, sentença normativa, acordo coletivo ou convenção coletiva.
§ 2º Quando da solicitação da repactuação para fazer jus a variação de custos decorrente do mercado, esta somente será concedida mediante a comprovação pelo contratado do aumento dos custos, considerando-se: (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
I - os preços praticados no mercado ou em outros contratos da Administração; ( Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
II - as particularidades do contrato em vigência;
III - (Revogado pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 4, DE 11/10/2009)
IV - a nova planilha com a variação dos custos apresentada; (Nova redação dada pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 4, DE 11/10/2009)
V - indicadores setoriais, tabelas de fabricantes, valores oficiais de referência, tarifas públicas ou outros equivalentes; e (Convalidado pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 4, DE 11/10/2009)
VI - a disponibilidade orçamentária do órgão ou entidade contratante.
(...)
Art. 41. Os novos valores contratuais decorrentes das repactuações terão suas vigências iniciadas observando-se o seguinte:
I - a partir da ocorrência do fato gerador que deu causa à repactuação; (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
II - em data futura, desde que acordada entre as partes, sem prejuízo da contagem de periodicidade para concessão das próximas repactuações futuras; ou
III - em data anterior à ocorrência do fato gerador, exclusivamente quando a repactuação envolver revisão do custo de mão-de-obra em que o próprio fato gerador, na forma de acordo, convenção ou sentença normativa, contemplar data de vigência retroativa, podendo esta ser considerada para efeito de compensação do pagamento devido, assim como para a contagem da anualidade em repactuações futuras; (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009)
§ 1º Os efeitos financeiros da repactuação deverão ocorrer exclusivamente para os itens que a motivaram, e apenas em relação à diferença porventura existente. (Nova redação pela INSTRUÇÃO NORMATIVA MP Nº 3, DE 15/11/2009) (...)”
28. A normatização acima reforça o que foi dito alhures, os casos de repactuação estão intrinsecamente ligados à variação nos custos dos insumos ou mão-de-obra necessários ao cumprimento do contrato, os quais oscilam em razão de questões mercadológicas consideradas de forma macro e não situações pontuais de cada sociedade empresária.
29. Por fim, destaca-se elucidativa manifestação de Lucas Rocha Furtado acerca da necessidade de observância aos requisitos legais em termos de propostas em licitações:
“De fato, admitir a aplicação da teoria da imprevisão aos contratos administrativos fora das circunstâncias definidas em lei, vale dizer, aceitar a recomposição de preços nos contratos a todo tempo e modo, na hipótese de o contratante apenas demonstrar alterações na relação econômica-financeira, seria negar qualquer sentido ao instituto da licitação e premiar o licitante que, por má-fé ou inépcia empresarial, apresentou proposta que, com o tempo, revelou-se antieconômica.
A licitação, caso não sejam definidos critérios rígidos para a aplicação da teoria da imprevisão, poderia conduzir à Administração à escolha de propostas apenas aparentemente mais econômicas. As empresas que oferecessem propostas adequadas, assentadas em previsões bem feitas e com margem de lucro razoável, poderiam ser derrotadas por propostas mal calculadas, que manifestariam seus malefícios somente meses mais tarde.
Variações de custos previsíveis, para mais ou para menos, são normais na atividade empresarial e constituem a álea normal do empreendimento a serem suportadas pelo empresário contratado. Impõe-se, desse modo, a definição dos requisitos necessários à recomposição do equilíbrio econômico do contrato.”[2]
30. Em conclusão, entende-se que a exclusão do SIMPLES NACIONAL, seja por opção da empresa, seja no caso de exclusão obrigatória decorrente da ultrapassagem do limite de enquadramento estipulado no art. 3º da Lei Complementar nº 123/2006, não confere o direito ao reequilíbrio econômico-financeiro, pois não se trata de reajuste, repactuação ou revisão com base no art. 65, II, “d” ou § 5º do mesmo artigo da Lei nº 8.666/1993.
É o parecer. À consideração superior.
Brasília, 31 de outubro de 2014.
Stanley Silva Ribeiro
Advogado da União
[1] Furtado, Lucas Rocha. Curso de Licitação e Contatos Administrativos. Ed. Fórum, Belo Horizonte, 2007, p. 616.
[2] Furtado, Lucas Rocha. Curso de Licitação e Contatos Administrativos. Ed. Fórum, Belo Horizonte, 2007, p. 610.
Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 00593001066201406 e da chave de acesso 61f452d9